
Um potiguar que mora há 10 anos em Montreal, no Canadá, está sendo impedido pela Justiça canadense de trazer os filhos para passear em Natal. Separado da mãe das crianças desde 2021, o engenheiro de computação Rafael Borja, de 41 anos, alega estar sendo vítima de discriminação e preconceito. Isso porque os pedidos de viagem têm sido negados sob a alegação do risco de ele “sequestrar” as crianças para o Brasil.
O caso demandou intervenção da Justiça porque a mãe não tem concordado com as viagens. O pai compartilhou o teor das decisões com a reportagem, mas os documentos não serão apresentados para não expor a identificação das crianças e da mãe. As crianças têm 5 e 7 anos de idade. Elas nasceram no Canadá, mas têm dupla cidadania, com registro em consulado brasileiro no Canadá.
Rafael, que também é cidadão canadense, vê preconceito nas decisões porque a Justiça canadense tem partido do princípio de que seria possível ele vir para Natal e simplesmente não voltar mais, sem qualquer implicação legal no Brasil. Ele lembra que o País é signatário de convenções internacionais e, em uma situação hipotética como esta (sequestro de crianças), o pai seria alvo de ações da Polícia Federal brasileira e obrigado a devolver as crianças ao seu país de origem.
O pai argumenta que sempre viajou com a família e veio outras vezes ao Brasil com os filhos quando ainda era casado. Só agora ele está enfrentando impedimento, mesmo apresentando passagens de ida e volta e declarando patrimônio e 10 anos de história no Canadá.
“Em uma das audiências, uma advogada argumentou que eu não tenho família no Canadá e, por isso, posso não voltar. Oito milhões de imigrantes vivem no Canadá. É como se 20% da população fosse vista pelas cortes do Canadá como não tendo vínculos com o país”, diz ele.
Rafael tenta viajar com os filhos para o Brasil, onde mora sua família, e outros locais desde 2021. A ex-mulher também é brasileira, natural do Rio Grande do Sul, e não tem concordado com as viagens justificando que Rafael pode não voltar com as crianças
“De melhor pai do antes de pedir o divórcio, eu passei a ser uma ameaça de sequestro. Ela começou a alegar que eu ia sequestrar as crianças. A gente que é brasileiro sabe que não dá para simplesmente sequestrar um menino para o Brasil e ficar impune”, afirma.
No Canadá, Rafael compartilha a guarda das crianças com a ex-mulher. Cada um fica 7 dias com os meninos, de maneira alternada. Em dezembro de 2022, ele conseguiu autorização da Justiça canadense para vir ao Brasil e passou férias em Natal com os filhos, mesmo com oposição da mãe, que já alegava risco de sequestro. Ele enviou fotos da viagem à reportagem. Ele diz que as férias transcorreram com normalidade.
“As crianças tiveram momentos inesquecíveis com os primos de 6 a 10 anos, que se falam todas as semanas, mas não podem estar juntos”, declarou.
No ano seguinte (2023), começou o impedimento. Em outubro daquele ano, Rafael conseguiu na primeira instância o aval para viajar em dezembro, mas dois dias antes do embarque a autorização foi derrubada pela juíza Marie-Claude Lalande, depois que a mãe se recusou a entregar os passaportes das crianças.
A juíza acatou os argumentos da mãe de que era suspeito o pai querer viajar com os passaportes brasileiros para entrar no Brasil, alegando que brasileiros podem entrar no País apenas com documento de identidade. “Para entrar no país, os nacionais têm que entrar com o passaporte do País, mesmo se tiver dupla cidadania”, declarou.
“A juíza perguntou o que asseguraria que eu não ia sequestrar as crianças. Falei logo que o Brasil tem leis muito severas para sequestro de crianças, que existe a Convenção de Haia e que as crianças têm mãe, escola, uma vida no Canadá. Ela negou a autorização de viagem que eu já tinha. Ela disse que eu não soube justificar a necessidade de ter passaporte brasileiro para as crianças. Para que eu quero passaporte se, pela alegação da mãe, eu vou sequestrar as crianças? Não faz sentido”, afirma Rafael.
Procurado por Rafael, o consulado brasileiro em Montreal emitiu uma nota declarando o respeito do País às leis.
Rafael recorreu para que a decisão fosse revertida, mas o recurso foi encerrado antes da audiência, pois a data da viagem já havia passado. A corte de apelações o orientou a solicitar uma nova autorização de viagem em primeira instância para uma próxima viagem.